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A psicoterapia como instrumento de emancipação para a pessoa LGBTQIA+ cristã

A psicoterapia como instrumento de emancipação para a pessoa LGBTQIA+ cristã

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A psicoterapia é instrumento de desenvolvimento psicológico que pode gerar maior autonomia e novos sentidos para os sujeitos que a ela recorrem. O objetivo da psicoterapia é, portanto, promover um sujeito emancipado e ativo no gerenciamento de sua própria vida, seus sofrimentos e suas potencialidades.

Um assunto que esquentou os debates recentes no campo da Psicologia no Brasil foi sobre de que forma psicólogas e psicólogos podem intervir em questões de sofrimento mental ligado à conflitos no âmbito da orientação sexual e identidade de gênero. Esses debates tinham um fundo religioso bastante evidente, sendo suscitados por pessoas vinculadas a instituições religiosas cristãs, sobretudo.

É bem conhecido que a moral cristã hegemônica compreende que a sexualidade deve ser vivida no âmbito de uma relação heterossexual monogâmica, e vê os papéis de gênero de forma naturalizada, nos quais o sexo biológico corresponde a uma determinada identidade de gênero. Sendo assim, todas as manifestações da sexualidade e do gênero que fogem à heterocisnormatividade são vistas como desviantes e precisam ser corrigidas ou suprimidas. Tal situação gera grandes conflitos e sofrimento psíquico em pessoas LGBTQIAP+ que foram formadas na religião cristã ou que encontram nela identidade e sentido de vida.

Hoje, é sabido que as orientações sexuais não heterossexuais e as identidades trans não constituem doença, distúrbio ou perversão e fazem parte da maneira como cada pessoa se constituiu no seu desenvolvimento biológico e psicossocial, e isto de forma independente da vontade consciente ou intenção da pessoa. É simplesmente a forma como ela é e funciona. Portanto, o conflito entre o que a pessoa é e seus sistemas simbólicos, afetivos e sociais relacionados à religião se torna uma fonte de grande sofrimento.

E a(o) psicóloga(o), como pode ajudar?

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Na psicoterapia, a(o) psicóloga(o) pode desenvolver uma série de ações que ajudem a pessoa atendida a superar sua situação de sofrimento e se desenvolver de forma saudável, harmoniosa e criativa. Vou descrever algumas dessas ações a seguir.

  • Acolhida – A(o) profissional de Psicologia irá acolher a pessoa que traz uma demanda de sofrimento por conflitos de gênero, sexualidade e religião em sua integralidade. Isto significa que receberá a queixa da(o) paciente de forma ética, empática e sem julgamentos. A acolhida envolve respeito à pessoa em todas às áreas de sua vida, inclusive em sua sexualidade, identidade de gênero e religiosidade. Isto cria um espaço seguro onde o sujeito pode se expressar sem medo e criar confiança na relação terapêutica.
  • Intervenção clínica – As intervenções em psicoterapia têm a finalidade de propiciar um espaço de desenvolvimento do sujeito através do diálogo, instrumentos e tarefas que a(o) terapeuta irá utilizar para estimular a reflexão, o autoconhecimento e a compreensão da(o) paciente sobre sua relação com a sexualidade, a religião e com os espaços sociais nos quais existe. As intervenções clínicas também possibilitam à pessoa atendida gerar novas narrativas sobre sua vida, o desenvolvimento de estratégias para superar os conflitos e o gerenciamento do sofrimento, assim como o reconhecimento de suas potencialidades para realizar mudanças em sua vida.
  • Informação/Psicoeducação – Fornecer informações relevantes possibilita que a(o) paciente amplie seu repertório de instrumentos culturais de forma que possa recorrer a eles para elaborar novos pontos de vista, sentidos e executar ações concretas para superar a situação de sofrimento. É importante que a(o) profissional tenha um amplo conhecimento não apenas de Psicologia, mas também sobre o fenômeno religioso e sobre gênero e sexualidade. Esse conhecimento interdisciplinar vai permitir que a(o) psicóloga(o) possa compreender profundamente a situação do sujeito atendido e garantir a ele o acesso a informações importantes para o seu processo terapêutico.

Por fim, é importante compreender que cada pessoa é única, portanto o percurso terapêutico de cada uma também será. Apesar disso, todo ser humano está inserido numa sociedade e numa cultura, e compreender os aspectos macrossociais que estruturam a personalidade é necessário para identificar os desafios e potencialidades que cada um tem disponível no ambiente em que vive.