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Por uma missão em diálogo

Por uma missão em diálogo

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“Num mundo plural e diverso, as perspectivas ecumênicas e do diálogo são fundamentais para qualquer esforço missionário”.

(Claudio Ribeiro, 2020, p. 371)

“O Verbo se fez carne e habitou entre nós”. (Evangelho de João, NT, 1,14)

Como sair de uma prática missionária cristã autorreferencial, com tendências colonizadoras, para uma prática missionária de forma dialógica, inclusiva e plural? Nossas reflexões giram em torno dessa pergunta.

Nossa compreensão se dá com base no princípio pluralista, que se constitui como elemento científico e plataforma teológica que reconhecem e valorizam o pluralismo (RIBEIRO, 2020). Buscaremos refletir a partir desse instrumento e indicar que a missão em diálogo é essencial na ação missionária da Igreja, pois ela é abertura e proximidade com o outro, e essa atitude pressupõe diálogo e respeito. A interculturalidade da missão a impulsiona para uma nova episteme. Isso é concretizado pelas teologias pluralistas, que reforçam os processos de alteridade ecumênica e procuram dar visibilidade à realidade de fronteira. A partir dos contextos fronteiriços ocorre o empoderamento dos grupos subalternos.

O teólogo Juan José Tamayo (2012, p. 136) afirma que o fazer teológico implica hoje uma nova episteme: “Se faz necessário buscar uma teologia que leva ao desprendimento do caduco, para posturas humildes que asseguram relações de reciprocidade com as diferentes culturas e credos”. Nota-se um aí um modo de missionar a partir da compreensão da alteridade, da proximidade e do diálogo, equacionando as relações socioeconômica, cultural religiosa levando em conta as subjetividades.

Nos últimos tempos, no contexto da Igreja Católica, somos motivados pelo Papa Francisco à cultura do encontro (Carta Encíclica Fratelli Tutti, n. 30). O documento da V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e do Caribe, realizada em Aparecida-SP, ressalta que missão é “a prontidão em se deixar transformar pelo encontro” (DAp 41.47). Acredita-se que, por intermédio do diálogo interpessoal, o ser humano faz a experiência das suas limitações, mas também descobre a possibilidade de superá-las e pode caminhar com confiança ao seu encontro do outro (DAp 21.49). Todavia, nos últimos tempos, teologia da missão reconhece os desencontros causados pela missão colonial que nem sempre olhou, questionou e deu a devida atenção à diversidade cultural e expressões religiosas e à vida do cotidiano.

Ribeiro (2020) aponta caminhos por meio das tarefas do princípio pluralista: 1) análise da realidade cultural e sociorreligiosa; 2) interpretação do contexto histórico a partir de uma visão pluralista considerando a alteridade ecumênica; 3) realçar as vozes dos grupos subalternos, com atenção aos elementos práticos, com crítica e autocrítica, que favoreçam a esses grupos maior empoderamento, confirmando as palavras de Jesus: “O Reino de Deus já está entre vós” (Evangelho de Lucas 17,21). Nesse sentido, o princípio pluralista valoriza a importância de se explicitarem as relações de poder, do diálogo entres as diferentes fés, nas quais nada é plenamente descrito e completo.

Assim, a missão é vista como tecido de fios interligados. O horizonte dela é permeado pela percepção de atitudes comprometidas pela dimensão de um comportamento relacional, interpessoal, na valorização das intersubjetividades. Tais comportamentos implicam atenção, respeito e acolhimento no que tange às relações interpessoais estabelecidas sobre as diferentes diversidades com as quais somos chamados a conviver e a dialogar. Assim, como afirma o Secretariado da Igreja Católica Romana para o Diálogo com os Não Cristãos, “o diálogo torna-se fonte de esperança e fator de comunhão na transformação recíproca” (DM 43).

As reflexões a partir do princípio pluralista nos levaram a correlacionar que a igreja, ao cooperar na missão de Deus, necessita acima de tudo considerar as preocupações práticas e as percepções teóricas que contribuem para equacionar as situações e demandas que emergem da pluralidade, em especial a religiosa. Assim, a tônica é uma missão em diálogo, que seja capaz de superar as tradicionais práticas missionárias baseadas em experiências colonialistas e hegemônicas para uma missão dialogante intercultural.

Portanto, missão se faz com postura de descolonização, com crítica ao pensamento único, com valorização dos saberes dos povos tradicionais e com uma postura contrária a todas as formas de controle, racismos, xenofobias, homofobias e machismos.


Referências

 IGREJA CATÓLICA-ROMANA. Documento de Aparecida: textos conclusivos da V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e do Caribe. São Paulo: Edições CNBB; Paulinas; Paulus, 2007.

 VEJA TAMBÉM
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IGREJA CATÓLICA-ROMANA. Secretariado para o Diálogo com os Não Cristãos. Diálogo e missão: Igreja e as outras religiões. São Paulo: Paulinas, 1984.

PAPA FRANCISCO. Carta Encíclica Fratelli Tutti. Sobre a fraternidade e a amizade social. Roma, 3 de outubro de 2020. Disponível em: http://www.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papafrancesco_20201003_enciclica-fratelli-tuxtti.html. Acesso: 1 fev. 2023.

RIBEIRO, Claudio de Oliveira. Princípio pluralista. São Paulo: Loyola, 2020.

TAMAYO, Juan José. Outra teologia es posible: pluralismo religioso, interculturalidad y feminismo. Barcelona: Herder, 2012.