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Reforma Protestante: o fracasso de uma teologia?

Reforma Protestante: o fracasso de uma teologia?

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A reforma protestante ocorreu no século XVI e foi um movimento decorrente de uma grave crise espiritual que se abatia sobre a Igreja Católica naquele contexto. As pessoas, de forma geral, não encontravam realização e satisfação em sua prática religiosa.

É preciso destacar que a Reforma Protestante, em sua perspectiva religiosa, foi um movimento interior, nascido dentro da própria Igreja Católica que se encontrava em crise, ou seja, o grande desejo não era de criar uma nova Igreja, mas sim transformá-la. Por isso, podemos considerar que a Reforma Protestante foi uma das grandes revoluções religiosas na modernidade e seu alcance se estendeu na vida cultural, social e política do Ocidente.

Como desdobramento desse movimento tem-se, inicialmente, duas orientações: o luteranismo e o calvinismo. Contudo, outros agrupamentos surgiram, tais como presbiterianos, anglicanos, puritanos, metodistas e batistas. Ao longo do tempo, esses ramos da Reforma multiplicaram-se em muitos sub-ramos, recebendo os mais diferentes nomes, mas, ao guardar os princípios fundantes, podem ser incluídos no que chamamos de religiões protestantes.

Além da sua importância histórica e política, como podemos pensar a Reforma Protestante na atualidade? Em uma reflexão inicial, podemos pensar que o protestantismo, nos dias de hoje, teve consequências muito diferentes, e até mesmo divergentes, das ideias dos primeiros reformadores.

Na atualidade, os protagonistas do que chamamos de movimento evangélico são os pentecostais e neopentecostais, em sua maior parte. Esses dois grupos, dentro do protestantismo brasileiro, tem se destacado na grande presença dos meios de comunicação de massa e na política. Seu principal discurso tem assumido a defesa da família e dos valores tradicionais como forma de resistência às grandes transformações pelas quais temos passado, tais como: o casamento homoafetivo, o movimento feminista e as discussões sobre aborto. Dá-se uma ênfase em conteúdo moral nas pregações, sendo que, nas raízes do cristianismo não se buscou moralizar a sociedade e nem condenar o mundo, apenas oferecer amor incondicional às pessoas.

De dentro de suas igrejas e de seus púlpitos – ungidos por Deus – educam seus fiéis a conseguirem espaços estratégicos em nossa sociedade, para defenderem seus princípios religiosos, políticos e sociais. Instruem, hoje, onde seus fiéis devem aplicar seu dinheiro, em quem votar, com quais pessoas se relacionarem, e prometem que através do seguimento fiel desses princípios, facilitações na vida financeira, sentimental e no trabalho acontecerão.

Em muitos encontros, receitas de sucesso milagrosas são dadas ao rebanho pelos pregadores em troca de doações financeiras. Somado a tudo isso, o uso dos meios de comunicação de massa, onde jogadores de futebol, atores, cantores, apresentadores, dentre outros exemplos de sucesso financeiro, através da fé, são divulgados como forma de corroborar os milagres.

A partir dessa pequena exposição, nos questionamos: a Reforma Protestante vivencia na atualidade seu fracasso teológico?

Pensemos.

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Em alguns espaços protestantes, hoje, condena-se o mundo secular, mas usa-se dos mesmos recursos seculares como forma de divulgação de suas propostas milagrosas de regeneração; afirma-se que no mundo secular habitam os inimigos bíblicos, mas defendem a busca pelo sucesso material. Lutero, durante a Reforma, criticou a falsidade espiritual, os escândalos da Igreja, o charlatanismo, as traições, o distanciamento das origens cristãs e todos os outros tipos de abusos praticados pela Igreja Católica naquele contexto. No entanto, percebemos posturas semelhantes na atualidade por diversas ramificações protestantes. Afirma-se que toda a postura humana deve ser fundamentada no texto bíblico, porém, rejeitam-se outros trechos fundamentais desse mesmo texto, tais como: amar o próximo como a ti mesmo; a mansidão; a filantropia; a opção pelos pobres; e a ajuda a todos os seres humanos sem julgamento.

Após a Reforma, acentuaram-se as noções de individualismo, reafirmando a autonomia do indivíduo frente à autoridade eclesiástica e às instituições religiosas. No entanto, essa postura tem se perdido, na medida em que, líderes religiosos interpretam e divulgam o texto bíblico, reforçando uma hierarquia sacerdotal profundamente criticada no século XVI. Ademais, essa interpretação ocorre de forma seletiva e fundamentalista, com o objetivo de justificar e manter práticas religiosas preconceituosas, excludentes, antidemocráticas e, em alguns momentos, violentas.

Difícil e profundo afirmar que na atualidade existe um fracasso teológico do protestantismo. Talvez, podemos afirmar que, o que existe tem a ver com a ausência da ordem teológica, isto é, nada se sabe do que significa o protestantismo e o cristianismo. Essas reflexões nos levam a afirmar que o protestantismo, em suas raízes, está sendo abandonado, e a religião se transformou num instrumento político e econômico, que objetiva promoção individual. Transformou-se em mais um mecanismo para atingir o lucro dentro da lógica capitalista, por meio da música gospel, do político gospel, da mídia gospel, da roupa gospel, das redes sociais gospel.

Assim, terminamos, o mundo secular se tornou a abertura para se alcançar o céu, as lideranças carismáticas, o exemplo de sucesso material e a redenção das coisas, o caminho para Deus?