Presença dos Evangélicos na Amazônia
Em nossos dias, a religião ganha cada vez mais destaque, seja por causa de episódios de violência e intolerância, pelo protagonismo político exercido por certos grupos ou a pela radicalização de alguns outros. A Amazônia não escapa a esta lógica e a correta compreensão da dinâmica religiosa na região é fundamental para o entendimento dos conflitos que ali se estabelecem.
Conhecer a história da presença do protestantismo na Amazônia é se aprofundar um pouco mais na própria história dessa região, que apesar de sua reconhecida importância, ainda ocupa um espaço à margem na historiografia nacional.
Os protestantes são assim chamados por terem sua origem na Reforma Protestante no século XVI, sendo antiga sua presença na Amazônia. A partir do período imperial, com uma maior liberdade para entrada de estrangeiros e a permissão para que estes exercessem sua fé em privado, a região recebeu protestantes que de início vinha fazer negócio nas prósperas cidades de Belém e Manaus.
O primeiro a realizar atividades proselitistas protestantes na Amazônia teria sido o americano Daniel Parish Kidder, missionário metodista. Chegando ao Rio de Janeiro com sua esposa no ano de 1837, foi enviado para Belém em 1839, época de grande efervescência social na província do Grão-Pará. Kidder testemunhou e registrou a Cabanagem, maior revolta popular do país.
No início do período que foi marcado pela exploração da borracha na região, missionários metodistas americanos para lá se deslocaram em busca não só de expandir a fé evangélica, mas também de favorecer os interesses de sua própria nação, já que os EUA viviam um momento de expansão econômica advinda de uma rápida industrialização.
Esses missionários pioneiros desejavam explorar tensões políticas na região, que chegou a ser vista como um foco do republicanismo no país. Segundo alguns missionários, as elites do Grão-Pará se ressentiam do descaso com que a corte imperial tratava as províncias setentrionais. É interessante, assim, a fala de Holden, um dos missionários pioneiros, que embora fosse escocês, veio ao Brasil encaminhado e financiado pela Sociedade Bíblica Americana para trabalhar na Amazônia
Assim, a expansão do reino dos céus se associava à expansão da influência americana, já que esta trazia consigo as virtudes da fé evangélica. Esse imbricamento revela a tensão que sempre houve entre fé e política e que caracteriza a presença protestante na Amazônia até hoje.
Conhecidos desde o século de XVI pelo lema sola scriptura (somente as escrituras/Bíblia), os primeiros missionários traziam consigo bíblias que eram distribuídas ou comercializadas entre a população, inclusive os ribeirinhos. Tal prática não poderia deixar de despertar resistência dos bispos de Belém, que apesar de se oporem as atividades missionárias protestantes, em especial a distribuição de Bíblias, nada fizeram de mais drástico para interrompê-la, senão proibir os fiéis de ler as Bíblias e escrever artigos nos jornais denunciando a “heresia protestante”.
O período imperial, em especial o segundo reinado, conheceu os primeiros esforços protestantes de fixarem sua presença religiosa na Amazônia. Mas é impossível compreender corretamente tal processo se não considerarmos a situação da Igreja Católica que exercia enorme influência na região desde os tempos colônias.
O movimento ultramontano, que buscava reformar o clero e a Igreja e submete-los à influência direta do papa, chegara ao Grão-Pará ainda na primeira metade do século XIX e levou o bispo de Belém, Dom Macedo Costa a entrar em conflito com autoridades civis. Essa disputa acabou isolando o bispo e teria facilitado o andamento dos primeiros trabalhos protestantes na Amazônia, que encontrou apoio em certas lideranças políticas.
Após a proclamação da República e a laicidade do Estado brasileiro ter sido estabelecida na Constituição de 1891, diversas denominações protestantes se estabeleceram na região de forma permanente, e assim, organizando suas igrejas. No ano de 1910 chegam a Belém os missionários suecos Gunnar Vingren e Daniel Berg, que trazem o pentecostalismo ao Brasil, doutrina baseada em um reavivamento espiritual que manifestasse os dons do Espírito Santo: falar a língua dos anjos, visões, curas, etc.
Gunnar Vingren e Daniel Berg, após dissensões na igreja Batista que frequentavam em Belém, motivadas por sua pregação pentecostal, fundam aquela que se tornou a maior denominação protestante do país, a Assembleia de Deus. Esta, uma vez que utilizava de misticismo em seus cultos (vistos como milagres frutos da ação do Espírito Santo), conquistou maior sucesso na região já acostumada a práticas místicas de origem indígenas que se mesclavam com o catolicismo popular.
Enquanto os protestantes tradicionais alcançavam, em cidades como Belém, certa relevância no cenário político, econômico e cultural, mas sem conseguir uma sólida base de fieis; o protestantismo pentecostal da Assembleia de Deus se espalha grandemente entre os estratos populares na cidade e no interior.
Os evangélicos pentecostais e neopentecostais tem crescido muito na nos estados amazônicos. Há cidades em que o número de evangélicos supera o número de católicos. Igrejas como: Assembleia de Deus, Igreja Universal do Reino de Deus, Igreja Deus é Amor , Igreja Quadrangular, tem conseguido por meio de atividades proselistas converter as pessoas de classe mais baixa para suas atividades religiosas.
Com enorme penetração na sociedade, através do pentecostalismo, e influência política e econômica; o protestantismo vai aos poucos estabelecendo novas forma de viver o mundo amazônico.
Referências
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PY, F.e REIS, M. V. F. Católicos Carismáticos e os Projetos Parlamentares de Leis. In: E. S. SENA; M. M. RIBEIRO Jr. (org.). Religião e Política, São Paulo e Belém: Fonte Editorial e EdUepa, 2015
JOÃO VINICIUS MARQUES GAIA é Discente do mestrado profissional em Ensino de História na Universidade Federal do Amapá (Prof. História/Unifap), com bolsa Capes. Possui graduação em História pela Universidade Federal do Amapá (2013), especialização em Educação Especial Inclusiva pela Faculdade de Teologia e Ciências Humanas (2017), especialização em Docência do Ensino Superior pelo Instituto de Ensino Superior do Amapá. Atualmente é professor do Governo do Estado do Amapá atuando principalmente nos seguintes temas: história em quadrinhos, História do Cristianismo, religião e educação e ensino de História. Membro do grupo de pesquisa CEPRES (Centro de Estudos Políticos, Religião e Sociedade), na Universidade Federal do Amapá. E-mail: jvggaia@hotmail.com MARCOS VINICIUS DE FREITAS REIS é Professor da Universidade Federal do Amapá (UNIFAP), em Macapá, Brasil, do curso de graduação em Relações Internacionais. Professor do Mestrado Profissional em Ensino de História UNIFAP e do Mestrado Acadêmico em História Social pela UNIFAP. Doutor em Sociologia pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR). Membro do Núcleo de Estudos de Religião, Economia e Política (NEREP-UFSCAR/CNPq). Pesquisador do Observatório em Direitos Humanos da Amazônia (OBADHUNIFAP/CNPq). Líder do Centro de Estudos Políticos, Religião e Sociedade (CEPRES-UNIFAP/CNPq). E-mail> marcosvinicius5@yahoo.com.br