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As religiões chinesas e a morte

As religiões chinesas e a morte

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San-jiao (Três Tradições) Chinesas

Estudiosos modernos chineses entendem como três as  religiões, ensinamentos”, ou tradições (Confucionismo, Taoísmo e Budismo). Contudo, abordaremos aqui o período anterior à formação do pensamento do Mestre Confúcio, assim como as visões sobre vida e morte, na visão taoísta ,por serem uma sistematização dos diferentes pensamentos que permeiam a religiosidade chinesa.

Configuração religiosa Chinesa

Na China atual como se vê no gráfico abaixo, publicado em 2015, maior parte da população considera-se sem religião, incluindo ateísmo. Contudo, entre a parcela da população que expressa alguma religiosidade, a chamada Religião Tradicional Chinesa aparece como o maior grupo religioso entre a população chinesa.

Informações do autor

Características da religiosidade Chinesa:

As religiosidades chinesas se caracterizam em maior ou menor grau por: 1) culto e veneração aos ancestrais 2) crença em um mundo sobrenatural, deuses e espíritos que se relacionam com o mundo humano. Dependendo da época, essas características vão aparecer com maior ou menor intensidade mais não quer dizer que não estavam presentes em outras. O surgimento de um culto organizado não faz com que outro seja perseguido ou extinto. Em geral na história da china algumas práticas coexistem.

Dinastias: Shang e Zhou

A China tem umas das mais antigas civilizações da história mundial. A primeira dinastia sobre a qual temos amplas evidências arqueológicas são as dinastias Shang e Zhou, respectivamente. Esse período da história chinesa é importante para compreendermos as mudanças e influências na religiosidade chinesa e suas relações religiosas e culturais com a questão da morte.

Shang (±1766-1122 A.C.)

Dominaram o Norte da China, área conhecida como a Grande Planície do Norte. Fundaram grandes centros urbanos, com melhor organização social e avanço com e maior utilização da escrita. Os reis dessa dinastia governaram como autoridades políticas e religiosas. Os reis Shang utilizavam ossos oraculares em rituais divinatórios para procurar respostas e obter conhecimentos sobre o futuro e tomar decisões. Os rituais funcionavam como meio de estabelecer canais de comunicação com as forças invisíveis que governavam os mundos. A divindades supremas eram chamadas de  Di ou Shangdi. Havia divindades associadas ao ambiente natural e elementos como rios e montanhas.

Os antepassados mortos se transformavam em um grupo de divindades do panteão Shang. Os ancestrais recebiam oferendas, a eles eram dedicados templos próprios e se fazia também sacrifícios de animais. Esses rituais envolviam o enterro de membros da família junto com o falecido senhor. As tumbas recebiam os pertences do morto, para que pudesse utilizar no pós-vida.

O povo shang acreditava que o mundo após a morte era uma continuidade desse mundo, que, portanto, estavam ligados. A morte, marca somente uma mudança de existência, mas tinha a ver como as relações entre os familiares acontecia. Pois, mesmo depois da morte era necessário manter uma boa relação com o familiar morto,  por meio de rituais de adivinhação e oferendas, para garantir bênçãos e ajuda dos ancestrais.

Zhou ± 1122-771 A.C.

No século XI a.c os Zhous tomam o poder e derrubam a dinastia Shang. Nas crenças,  aos poucos a Tian (Céu) vai tornando-se a principal divindade do panteão chinês. Textos Zhaous descrevem Tian como interessado no bem-estar e no comportamento moral do povo, assim, comportamentos virtuosos e harmonia social foram promovidos como forma de agradar a divindade.

Nesse período, há uma promoção de valores humanizados de condutas morais, que também influenciaram no modo de relacionamento com o mundo espiritual. Agradar a divindade passou a depender de como o chinês comportava-se moralmente, tanto individual quanto socialmente, mais do que os rituais de oferendas e sacrifícios.

O culto aos antepassados continuou como parte fundamental das tradições religiosas, mas houve um avanço desses cultos para as pessoas comuns passando a ser algo ligado também à conduta moral. A noção de piedade filial torna-se de extrema importância. As mudanças nos rituais funerários estão mais ligadas à generalização dos cultos para a população comum e ao fortalecimento das relações dos antepassados com a estrutura da hierarquia familiar.

Confucionismo (O pensamento do Mestre Kong ou também Kung Fuzi)

Confúcio nasceu em Lu, nordeste da China, viveu de 770-476 a.C., e pertencia á dinastia Zhou, em um período turbulento e de convulsão social. Confúcio foi um dos pensadores que tentou reanimar o sentimento de crise que a China passava. Entendia a si como um restaurador e transmissor de valores e tradições antigas e não um criador de algo novo ou religioso. Seu principal interesse era a vida e a ordem social. Com sua base humanista, acreditava em Tien e acreditava que os valores e sistemas sociais e políticos que defendia, colocava os seres humanos seguindo a ordem universal, o Tao (Caminho).

O pensador reconhecia a existência do espiritual e sobrenatural, porém, não era interessado nessas questões. As duas principais virtudes são o ritual (li) e a benevolência. Li significava um rito ou cerimônia religiosa, principalmente os sacrifícios a divindades e ancestrais. No confucionismo, ritual passou a um padrão de conduta social.

Sobre a Morte e Rituais Funerários

Deve-se notar que nos rituais confucionistas nunca se representam as divindades e os espíritos por imagens. Uns e outros apenas são representados por tabuinhas onde se escrevem os seus nomes.

Durante a cerimônia funerária a tabuinha trazia a divindade superior. Colocavam-se as tabuinhas dos antepassados das dinastias, para que também participassem no rito sacrifical que se desenvolvia em nove atos solenes. Colocavam o Pi (disco de Jade) e as doze peças de seda sobre o altar e terminava com a despedida dos antepassados e a queima das oferendas.

 Taoísmo

Sun Tzu, foi o grande mestre que compilou os princípios que gerem as escolas taoístas, no livro conhecido como Tao Te Ching (algo como O livro do Caminho). O Taoísmo preocupa-se mais em ter uma vida mística e de integração com a natureza, buscando levar uma vida harmoniosa com o Cosmos. Alguns autores afirmam que Taoísmo se formou a partir da sistematização de cultos que já existiam na sociedade chinesa, a partir do acúmulo de experiências, reflexões e compreensões de muitos mestres, ao longo dos milênios.

 VEJA TAMBÉM
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Assim, surgiram várias vertentes dentro das chamadas tradições de Artes de Sabedoria: Medicina Tradicional Chinesa (MTC); Feng Shui que estuda os seres humanos e as energias dos ambientes; Yi Jing I Ching, a astrologia, as práticas marciais; o Tai Ji Quan (Tai Chi Chuan) e do Qi Gong, exercícios para energia vital humana.

Morte e Rituais Funerários

Ao contrário da visão ocidental, os Chineses possuem um conceito de complementariedade dentro das relações no universo. A combinação de Yin e Yang, representam aspectos diferentes da existência, porém, que se complementam em uma relação dinâmica. A vida e a morte representam dois estados distintos e complementares da mesma grande existência. Nesta comparação, o Yang corresponde à vida enquanto o Yin corresponde à morte. Acredita-se na continuidade da alma do indivíduo, mesmo após a morte.

A morte fisiológica do ser humano, sua alma abandona o corpo físico e entra em um processo espiritual que o conduz a um renascimento posterior, a um novo ciclo de vida e morte. Há seis grandes caminhos que a alma pode tomar: Caminhos do Homem, do Céu, da Divindade Obscura, do Animal, das Prisões Terrestres e da Alma Esfomeada.

Rituais ou práticas são feitos desde o dia do falecimento até quarenta e nove dias após a morte. São realizados diariamente, de sete em sete dias, somente no sétimo ou no quadragésimo nono dia após a morte da pessoa, tudo de acordo com as condições e possibilidades dos familiares. Os corpos podem ser enterrados ou cremados.

Os taoístas acreditam que um bom enterro, quando bem realizado e em um local adequado, traz benefícios para a alma do falecido em seu renascimento, quanto a longevidade de seus descendentes por muitas gerações. Quando o ritual não é respeitado, pode ser acarretar maldições para filhos/filhas e netos/netas, assim como a transição da alma do falecido.

Concluindo

Vimos dentro das tradições apresentadas que apesar das mudanças sociais, muitas práticas atravessaram gerações e foram sendo difundidas ao longo dos séculos. A China com sua grandiosidade mostra uma complexidade muito grande também no campo religioso, devido às práticas serem em geral no ambiente familiar.


Referências

GAARDER, Jostein; HELLERN, Victor; NOTAKER, Henry. O livro das religiões. São Paulo: Companhia das Letras, 2005.
POCESKI, Mario. Introdução às religiões chinesas. São Paulo: UNESP, 2013.


Websites

AMARO, Ana Maria. Rituais da morte rituais da vida na antiga China.
ASSOCIATION OF RELIGION DATA ARCHIVES (the ADA). China.
NITHAK, Frei Eduardo Chagas. Pensamentos: confucionismo.