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Protagonismo Feminino na Wicca

Protagonismo Feminino na Wicca

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Quando ouve falar em bruxas, a maioria das pessoas imagina senhoras de rosto enrugado, vestidas com longas roupas negras, um chapéu pontudo e uma verruga no queixo. Esse imaginário, construído durante a Inquisição, na Idade Média, ainda está presente na contemporaneidade. Por outro lado, desde o século XIX, na Europa, e a década de 1980, no Brasil, existem pessoas que se identificam com essas bruxas e procuram reconstruir a religião praticada antes do cristianismo, da qual elas supostamente seriam as herdeiras e continuadoras.

A Wicca é parte do movimento religioso conhecido como neopaganismo ou paganismo contemporâneo, que busca estabelecer um culto atual politeísta inspirado em antigas civilizações tais como Celta, Grega e Romana.  A liturgia da Wicca baseia-se na celebração dos festivais Celtas ligados às estações do ano e ao ciclo de plantio e colheita, onde cultua-se um casal sagrado, a Deusa e o Deus – considerado seu filho e consorte.

O surgimento oficial da Wicca data da década de 1950 com a publicação dos escritos de Gerald Gardner, um funcionário público britânico interessado em etnologia e folclore que alegava pertencer a um coven de bruxaria tradicional. Para propor seu sistema religioso, Gardner buscou inspiração na liturgia de diversas ordens de mistérios como a Maçonaria, a Rosa Cruz e a Golden Down, e na obra dos antropólogos e folcloristas que descrevem os antigos festivais pagãos e Celtas, como James Frazer e Margareth Murray.

A Wicca é praticada em convéns de até treze pessoas liderados por uma sacerdotisa ou sacerdote orientados por um Livro das Sombras, uma espécie de diário onde as bruxas e bruxos registram seus rituais. Sua liturgia consiste na celebração dos sabats e esbats. Os sabats marcam a passagem do sol pela roda do ano, com dois solstícios e dois equinócios, e as datas entre eles, o que resulta em oito celebrações anuais. Já os esbats são rituais destinados a celebrar as fases da lua, onde cada uma delas representa uma face da Deusa. Na Wicca, a lua e seu ciclo é associada à Deusa e ao Sagrado Feminino, enquanto o sol representa o Sagrado Masculino.

Quando a Wicca passou a ser praticada nos Estados Unidos, a partir dos anos de 1960, misturou-se com os ideais da contracultura e do feminismo. Surgiu na Califórnia a Wicca Reclaiming, liderada por Starhawk. Nesta vertente, cultua-se prioritariamente o sagrado feminino, com destaque para o ativismo político, feminista e ecológico, pois a preservação da natureza e a luta pelos direitos das mulheres são compreendidos como parte do culto à Deusa.

Na Wicca, muitas mulheres são as altas sacerdotisas, comandantes máximas dos covens. Na maioria das vertentes e tradições de Wicca também é permitido o sacerdócio masculino, no entanto, todos os homens que se envolvem na religião devem estar conscientes que a mulher será reverenciada com o máximo respeito. Isto porque a Wicca acredita que a mulher é a encarnação do poder sagrado da Deusa, representado pela sua capacidade de gerar a vida. A sexualidade e o corpo também são considerados sagrados na Wicca, por serem também uma expressão deste poder gerador.

Os adeptos da Wicca acreditam que a era moderna precisa curar as “feridas do patriarcado”, que se expressam pela visão negativa que muitas espiritualidades atribuíram a mulher e ao feminino, associando-o ao mal.

Atualmente existem algumas dezenas de tradições de Wicca no Brasil, uma quantidade ainda maior de covens, um circuito de eventos e um número desconhecido, mas provavelmente muito grande, de praticantes solitários. A internet é a principal forma de comunicação entre os praticantes de Wicca, que também se organizam em associações civis, onde militam por causas políticas e feministas.

A presença da Wicca no campo religioso e no espaço público brasileiro é uma expressão da diversidade religiosa e demonstra uma das possíveis relações entre religião, política e feminismo.