A era jovem da relação entre religião e magia
Religião e magia sempre se relacionaram, sendo ambas a face de um mesmo fenômeno. O que as diferencia é a natureza de suas funções. Ou seja, é através dos ritos que se torna possível delinear o que cada um vem a ser.
Durante a pesquisa, que foi desenvolvida [1] no bairro Capelinha-Betim-MG, nos anos de 2013 e 2014, realizada através da assistência de quatro cultos religiosos por meio de observação participante, constatou-se a presença de elementos caracterizados tipologicamente como mágicos. Em síntese, identificou-se também que algumas igrejas utilizavam dias específicos para realizar cultos que atendiam a uma demanda específica. Havia campanhas para libertação, descarrego, cura, prosperidade e culto de casais.
Duas igrejas visitadas utilizavam em seus cultos elementos como óleos, rosas ou tecidos e atribuíam a esses elementos o poder de trazer soluções aos problemas dos fiéis, o que até aí caracterizaria o fazer religioso contemporâneo. Contudo, observamos também que, com a utilização desses elementos no culto, os mesmos eram assumidos como portadores de poder para solucionar determinados problemas individuais.
Diante desse quadro, vale ressaltar que a magia se caracteriza pelo uso de diversos elementos – objetos que, numa perspectiva mágica, são interpretados como portadores de poder na sua prática ritual. Ainda assim, os objetos são consagrados no sentido de empoderar o mago, a fim de atingir a eficácia do seu rito. Posteriormente, entende-se que são atribuídos a esses elementos o poder de trazer soluções às necessidades de seus clientes. Esses elementos são manuseados e coagidos pelo agente da magia, a saber, o mago, e, sobretudo, pela sociedade que os define como algo sagrado quando obedecem as condições para a apropriação do tempo e espaço. O que é comum a magia e a religião, se expressa na dimensão do sagrado, é revelada através da apropriação desses elementos, os quais indicam que o caráter mágico-sagrado-religioso adquire uma dimensão importante dentro da sociedade que crê nesse caráter. Uma vez que, os fenômenos da religião e da magia irradiam da crença.
Neste contexto, esses elementos indicam que o caráter mágico adquire dimensão importante na prática religiosa, o que bem se coaduna com a religiosidade contemporânea e que muito diz sobre o perfil religioso da juventude moderna, que reivindica para si o próprio espaço para que possa modelar a sua religiosidade. Para tanto, as instituições buscam atender tais demandas individuais e coletivas dos fiéis, oferecendo “soluções” que atendam às suas expectativas. Ou seja, a partir da necessidade do indivíduo instaurou-se a origem dos poderes mágicos. O indivíduo carrega consigo desde superstições até receitas de simpatias, e de forma casual dá vida a toda essa imaginação. Logo, o indivíduo exprime, a partir de tantas mutações e através da sua cultura, o seu novo modelo de sociedade. Uma sociedade liberta e disponível a novas experiências e que seja capaz de desempenhar controle sobre as diversas instituições se constituem no seu bojo. Mesmo em volta a tanta subjetividade, a religião ainda conserva uma série de ritos, símbolos e significados, que agem a partir da coletividade, mesmo sendo efetuados e alicerçados na individualidade do sujeito, ainda assim prevalecendo a ideia de comunidade.
A religião e a magia não apenas tem sua origem na sociedade, mas identifica-se com ela. Ou seja, a religião se caracteriza na contemporaneidade a partir dos anseios que a sociedade julga e expressa serem relevantes. Mesclam-se aos resquícios de uma religião os traços de um forte individualismo religioso, em que a magia se acentua por estar em seu habitat natural, uma vez que se resume na arte do fazer.
[1] Projeto Senso Religioso e contemporaneidade (FIP- Fundo de Incentivo a Pesquisa PUC Minas 2013/8408-2S).
Doutoranda e mestre em Ciências da Religião pelo Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião (bolsista CAPES), licenciada em Pedagogia com aprofundamento em Ensino Religioso, ambos cursos realizados na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Foi bolsista de iniciação científica pelo Fundo de Incentivo à Pesquisa da PUC Minas. É membro do Grupo de Pesquisa Religião e Cultura/CNPq desde 2013. Atuou como organizadora do Colóquio do Grupo de Pesquisa Religião e Cultura por quatro edições (2015, 2016 ,2017 e 2019). Atualmente tem se dedicado à pesquisa sobre o estudo comparativo do perfil teórico-metodológico das propostas pedagógicas dos Programas de Pós-graduação em Ciência(s) da(s) Religião(ões) no Brasil (2017-2020) a partir das noções de disciplinaridade e interdisciplinaridade. Tem experiência em pesquisa, docência e gestão de projetos. Atua também no Conselho Editorial da Revista Senso, um magazine online de Ciências da Religião aplicada.